MELHORES
POEMAS - MANUEL BANDEIRA
Por ALINE RAFAELLA DE SOUZA.
(PET-Letras/UNICENTRO)
SOBRE
O AUTOR
Manuel Carneiro de
Souza Bandeira Filho nasceu em 1886 no Recife. Desde cedo tem seus primeiros
contatos com a poesia e com dez anos, já morando no Rio escreve seu primeiro
poema, o qual é publicado na primeira página do jornal Correio da Manhã.
O poeta estudou para
arquiteto em São Paulo, mas devido a sua doença no pulmão no fim do ano letivo
de 1904 teve de abandonar os estudos.
Volta ao Rio em busca
de climas serranos e em 1910 entra na Academia Brasileira de Letras. Em 1913
vai para a Europa onde tem contato com alguns poetas e reaprende o alemão
estudado no ginásio. Em 1914, devido a Grande Guerra, volta ao Brasil.
Em 1921 conhece Mário
de Andrade, com quem se correspondia há algum tempo, porém recusa-se a
participar da Semana da Arte Moderna em São Paulo em 1922.
A partir de 1924
publica críticas, poesias e artigos e assim, ganha um grande espaço entre as
obras publicadas de sua época. Entre 1929 e 1930 escreve crônicas de semana em
semana para o Diário Nacional de São Paulo.
Em 1935 é nomeado
inspetor de ensino secundário e em 1936 é homenageado pelo seu cinquentenário.
Nos anos seguintes
recebe inúmeras premiações por suas obras e torna-se um dos poetas mais reconhecidos
do cenário brasileiro.
Em 1968, Manuel
Bandeira falece em Botafogo e é sepultado no Mausoléu da Academia Brasileira de
Letras, no cemitério São João Batista. “A obra escrita do
autor foi muito vasta e rica, e até hoje é de grande importância para os
estudos de literatura brasileira.” (ARAÚJO, 2012, p. 01).
A OBRA
Os escritos de Manuel
Bandeira fazem parte da literatura brasileira desde 1917 com a publicação de A Cinza das Horas. Dois anos depois com
o poema “Os Sapos”, cria uma ênfase desigual
entre os modernistas.
A obra deste
inigualável poeta traz novidades aos poemas brasileiros. “Seu esforço de
renovação, sua “mensagem”, como então se dizia, não obedece a nenhum programa
definido e não se prende a compromissos.” (HOLANDA, 1974, p.13).
A poesia de Bandeira
torna-se única pelo fato de existir certa liberdade lírica, já que a
preocupação técnica não é o foco principal de sua obra. “(...) O lirismo de
Manuel Bandeira não é produto de laboratório, mas vem, como toda verdadeira
poesia, de fontes íntimas, exigindo, para realizar-se, condições que não se
podem forjar arbitrariamente.” (HOLANDA, 1974, p.13).
Apesar de o poeta
usar as paisagens e as cenas visíveis em sua obra, nota-se uma certa
obscuridade em sua poesia que faz com que o leitor aprecie, entre neste mundo
obscuro e sinta de perto a distância que o separa do mesmo.
A Cinza
das Horas traz todo o estilo modernista à tona. João Ribeiro comenta na
nota preliminar da obra: “Rimas e
vocábulos? Até idéias, de antemão enfileiradas, servem aos maus poetas.
(...) A Cinza das Horas, pequenino
volume, é, neste momento, um grande livro.” (RIBEIRO, 1974, p.115).
Não poderíamos deixar
de falar sobre uma das mais notáveis obras de Manuel Bandeira que se intitula: Vou-me embora pra Pasárgada. É
importante saber do próprio autor como esse poema foi construído.
Em sua biografia
publicada no Brasil, Itinerário de
Pasárgada, Bandeira escreve:
Quando eu tinha os meus quinze anos e traduzia na classe de grego do
Pedro II a Ciropedia fiquei encantado
com esse nome de uma cidadezinha fundada por Ciro, o Antigo, nas montanhas do
sul da Pérsia, para lá passar os verões. A minha imaginação de adolescente
começou a trabalhar, e eu vi Pasárgada e vivi durante alguns anos em Pasárgada.
Mais de vinte anos depois, num momento de profundo cafard e desânimo, saltou-me do subconsciente este grito de evasão:
“Vou-me embora pra Pasárgada!” (...) Se há belezas em “Vou-me embora pra
Pasárgada”, elas não passam de acidentes. Não construí o poema; ele
construiu-se em mim (...) as histórias que Rosa, a minha ama-seca mulata, me
contava, o sonho jamais realizado de uma bicicleta, etc. O quase inválido que
eu era ainda por volta de 1926 imaginava em Pasárgada o exercício de todas as
atividades que a doença me impedia: “E como eu farei ginástica... tomarei
banhos de mar!” A esse aspecto Pasárgada é “toda a vida que podia ter sido e
que não foi”.
Eis o poema:
VOU-ME EMBORA PRA PASÁRGADA
VOU-ME EMBORA pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água.
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
─ Lá sou amigo do rei ─
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Em 1913, Manuel Bandeira escreve versos
para sua irmã Maria Cândida de Souza Bandeira, a qual era sua enfermeira.
A MINHA IRMÃ
DEPOIS QUE A DOR, depois que a desventura
Caiu sobre o meu peito angustiado,
Sempre te vi, solícita, a meu lado,
Cheia de amor e cheia de ternura.
É que em teu coração inda perdura,
Entre doces lembranças conservado,
Aquele afeto simples e sagrado
De nossa infância, ó meiga criatura.
Por isso aqui minhalma te abençoa:
Tu foste a voz compadecida e boa
Que no meu desalento me susteve.
Por isso eu te amo, e, na miséria minha,
Suplico aos céus que a mão de Deus te leve
E te faça feliz, minha irmãzinha...
O poema “Oceano”, também incluso em A Cinza das Horas, revela a poesia
moderna que se formava no início do século XX.
OCEANO
OLHO A PRAIA. A treva é densa.
Ulula o mar, que não vejo,
Naquela voz sem consolo,
Naquela tristeza imensa
Que há na voz do meu desejo.
E nesse tom sem consolo
Ouço a voz do meu destino:
Má sina que desconheço,
Vem vindo desde eu menino,
Cresce quanto em anos eu cresço.
─Voz de oceano que não vejo
Da praia do meu desejo...
Na publicação do volume de poesia Carnaval, os poemas denunciam Manuel
Bandeira como um simbolista. Em sua nota preliminar feita por Alceu Amoroso
Lima encontram-se as seguintes palavras:
O simbolismo não é senão um dos momentos agudos do individualismo
artístico, e, em princípio, seria um contra-senso estudar as influências,
literárias ou outras, sofridas por um simbolista, que é essencialmente um
independente. No Sr. Manuel Bandeira, são inegáveis essas influências, mas não
menos sensível e evidente é o que mostra de pessoal e espontâneo. (LIMA, 1974, p. 154).
É nesse momento, em
1918, que Bandeira escreve o poema “Os
sapos”, que os modernistas abraçam e fazem desta obra um símbolo do
modernismo.
OS SAPOS
ENFUNANDO os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
─ “Meu pai foi à guerra!”
─ “Não foi!” ─”Foi!” ─ “Não foi!”.
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: ─ “Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.
O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.
Vai por cinqüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A formas a forma.
Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas...”
Urra o sapo boi:
─ “Meu pai foi rei” ─ “Foi!”
─ “Não foi!” ─”Foi!” ─ “Não foi!”.
Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
─ “A grande arte é como
Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo.”
Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
─ “Sei!” ─ “Não sabe!” ─ “Sabe!”.
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;
Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo cururu
Da beira do rio...
Em sua publicação O Ritmo Dissoluto, as poesias de Manuel
Bandeira trazem mais uma vez surpresas, delineando uma nova forma de compor e
uma voz própria do autor. Essa publicação abre um novo caminho para a poesia.
Na nota preliminar desta obra, Antônio Olinto infere: “A novidade de O Ritmo Dissoluto estava
também na forma, no modo de unir as palavras, de lhes dar outra vida, outros
sentidos, às vezes com uma simples justaposição de termos (...), com uma conotação.” (OLINTO, 1974, p.
180).
Nesse novo estilo os
poemas são mais angustiantes, sombrios... Apresentam ansiedade, uma busca pelo
perdido. Refletem assim, a voz de Manuel Bandeira no papel.
O SILÊNCIO
NA SOMBRA cúmplice do quarto,
Ao contato das minhas mãos lentas
A substância da tua carne
Era a mesma que a do silêncio.
Di silêncio musical, cheio
De sentido místico e grave,
Ferindo a alma de um enleio
Mortalmente agudo e suave.
Ah, tão suave e tão agudo!
Parecia que a morte vinha...
Era o silêncio que diz tudo
O que a intuição mal adivinha.
É o silêncio da tua carne.
Da tua carne de âmbar, nua,
Quase a espiritualizar-se
Na aspiração de mais ternura.
Os poemas deste
renomado poeta estão fixados na literatura brasileira fazendo história e
conservando o nome de seu autor mais vivo do que nunca.
A obra de Manuel
Bandeira faz dele um ícone brasileiro, o qual deixou a sua mais bela
contribuição para nossas obras literárias.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Trajetória de uma poesia. In: Manuel Bandeira poesia completa e prosa. 3ª
Ed. Rio de Janeiro, Companhia José
Aguilar Editora, 1974. p. 13-25.
RIBEIRO, João. A Cinza das Horas. In: Manuel
Bandeira poesia completa e prosa. 3ª Ed.
Rio de Janeiro, Companhia José Aguilar Editora, 1974. p. 115-151.
LIMA, Alceu Amoroso. Carnaval. In: Manuel Bandeira poesia completa e prosa. 3ª Ed. Rio de Janeiro, Companhia José Aguilar Editora, 1974. p. 153-178.
OLINTO, Antônio. O ritmo dissoluto. In: Manuel
Bandeira poesia completa e prosa. 3ª Ed.
Rio de Janeiro, Companhia José Aguilar Editora, 1974. p. 179-197.
BANDEIRA, Manuel. Itinerário de Pasárgada. In: Manuel
Bandeira poesia completa e prosa. 3ª Ed.
Rio de Janeiro, Companhia José Aguilar Editora, 1974. p. 27-102.
ARAÚJO, A. Ana Paula de.
Biografia de Manuel Bandeira. Disponível
em: http://www.infoescola.com/escritores/biografia-de-manuel-bandeira/,
2012, p. 01.
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